Tuesday, April 25, 2006

[25 DE NOVEMBRO, SEMPRE]

O 25 de Abril de 1974 ocorreu 2 anos e 34 dias antes de eu nascer.
Nasci também 335 anos e sete meses depois da restauração da independência de Portugal face a Espanha.
Servem estas referências para dizer que não vivi nenhum destes dois momentos históricos do nosso país, um em que nos livramos de uma ditadura, outro em que nos livramos do jugo estrangeiro.
Hoje em dia, no estado em que está Portugal, não estou certo que todos os portugueses aplaudam ainda o 1 de Dezembro de 1640, atenta a diferença de evolução de Portugal e Espanha.
Eu não, eu aplaudo ambas as datas com a mesma, exactamente a mesma vontade, porque as não vivi e por isso para mim, significam o mesmo, a libertação do povo, primeiro da opressão espanhola, depois pela opressão do regime salazarento.
E porque as não vivi, permito-me poder ter uma visão distanciada das mesmas, visão essa impossível a quem viveu esses momentos, particularmente os de 74, pois dos outros só nos livros podemos contactar com a história.
Visão essa que vai muito para além do ultrapassado “25 de Abril sempre” que alguns gritam nestas alturas mas não praticam durante o ano.
O 25 de Abril, para muitos, tornou-se como o Natal para quase toda a gente. No Natal apregoa-se a paz, a compaixão, a amizade, diz-se que o Natal deve ser todos os dias, fala-se dos sem abrigo, dos vencidos da vida, da solidariedade, para logo a seguir se esquecer tudo e se voltar à vida quotidiana normal, egoísta, em que cada um pensa em si primeiro e depois nos outros, volta-se às dificuldades, ao preço da gasolina, do pão, dos livros na escola, da roupa, das escolas a fechar, das maternidades a fechar, da lei da rolha na judiciária, da demagogia na justiça, etc…
O 25 de Abril tornou-se mais ou menos em algo de igual. Apregoa-se a defesa de liberdade, os valores de Abril, dão-se vivas aos heróis que depuseram o regime, para no resto do ano ignorar a democracia, os direitos dos outros, e aquilo que apregoaram, nessa altura, com cravos na lapela.
O 25 de Abril poderia ter sido uma data trágica para a nossa democracia não fora o 25 de Novembro.

Esse, que todos ignoram por sistema, foi o verdadeiro grito da liberdade, foi aí que se gerou a democracia verdadeira, a da liberdade.
Não fora o 25 de Novembro e teria a ditadura de direita sido substituída por uma de esquerda, comandada por Moscovo, como marionetas a dançar.
Sei bem o que fazia Moscovo naquela altura e antes. Estou agora a ler um livro com uma profunda pesquisa sobre a vida de MÃO TSE TUNG, onde se descreve com pormenor o que o PCUS Russo fez na China, chegando ao ponto de apoiar um partido nacionalista, imaginem, contra o próprio partido comunista chinês, apenas porque este tinha mais militantes e, por conseguinte, maior capital humano para chega ao poder. E MAO, o líder comunista, foi ele próprio membro do partido nacionalista, a fim de poder obter o seu desejo de chegar ao poder e fazer o que fez.
Foi a isto que Portugal esteve sujeito e que os “autores” da história branqueiam todos os anos.
Sim, branqueiam, porque se o ACTO HERÓICO DE DEPOR A DITADURA MERECE OS MAIS RASGADOS APLAUSOS, o que a seguir se passou ENVERGONHA, pois houve uma tentativa de apropriação do Estado e uma sovietização do mesmo, manietada e controlada por Moscovo, tal como foram os países de leste, e isso significaria apenas a substituição de uma ditadura por outra, sem que a liberdade, aquilo que tantas vezes se apregoa e se não cumpre, fosse uma realidade, pois sabemos bem como funcionaram e funcionam os regimes comunistas. A história mostrou-nos e mostra-nos a realidade, o que se fez aos direitos humanos nos países de leste, o que ainda se faz em Cuba, na Coreia do Norte, etc..
Essa teria sido a segunda noite negra da ditadura, com o mesmo lápis, talvez já não azul, com a mesma polícia, mas já sem o nome de PIDE, com o mesmo medo de falar, mas com outros titulares do poder.
É disso que NUNCA ninguém fala, que todos calam e consentem e que faz em mim nascer uma revoltar por hoje, em democracia, haver um lápis azul na história recente de Portugal, por haver quem esconda e mande para o baú ou para o sótão essa realidade.
Sei que muitos não aplaudirão este discurso, e eu fico contente com isso. Sei que assim não agradei ao establishment do 25 de Abril, aqueles que se apregoam de donos da liberdade e que, em democracia e liberdade, censuram os que pensam de modo diferente.
Todos aqueles que não me vão aplaudir estão a fazer o mesmo que a PIDE fazia, estão a traçar o discurso com um lápis azul, calando a voz de um cidadão livre só porque diz o que pensa e se recusa a ser subserviente a uma história que não é contada como devia, a bem da verdade.
É por isso que Abril ainda não se cumpre hoje em dia, e Novembro também se não cumpre, porque de forma encapotada, os mesmos de sempre censuram quem deles discorda, fazendo-o com formas mais refinadas, mais evoluídas, mais disfarçadas, mas aquela cor azul do risco em cima de uma folha escrita por uma mente livre está lá, em suspenso, cravado sobre a pessoa, sobre a imagem, sobre a palavra, sobre o discurso, está lá, no silêncio, na cara fechada, nos acenares de cabeça.
Por isso eu digo, o verdadeiro Abril só se cumprirá quando a geração do mesmo já cá não estiver, e se calhar a que se lhe segue também não.

Pois só aí, de forma livre e independente, se poderá olhar para Abril como hoje se olha para Dezembro, o de 1640, e se poderá analisar friamente o que de facto a data significa para o país.
Entendo que só aí seremos verdadeiramente livres, da ditadura e dos fantasmas da mesma que ainda hoje pairam em tantas cabeças.
É por isso que a história tem que ficar escrita, para que se não esqueça dela, e por isso é que defendo que se comemore o 25 de Novembro, como se comemora o 25 de Abril, porque um sem o outro nada é, sob pena de se apagar da história e da memória, o verdadeiro dia da liberdade da ditadura, a da direita e a da esquerda.

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